quarta-feira, 15 de maio de 2013

Wake up, little Susie

De repente, a vida resolveu correr... muita coisa para escrever, muita coisa para fazer... O Viagens ficou abandonado. O cinema e os livros também - estamos na metade do mês, e ainda não entrei numa sala de cinema. Mas entre abril e maio, este mês que está desaparecendo entre dias corridos, houve livros e filmes que ainda não havia comentado aqui.

O primeiro deles foi Os Croods (The Croods. Kirk De Micco, Chris Sanders. US, 2013) animação que acabou esquecida no post anterior. Eu a vi duas vezes, com as crianças. Rimos demais, nos divertimos um monte, mas dela, o que permaneceu, foi como as histórias podem aparece na nossa vida. Pensamos muito nelas como se tivessem uma obrigação de transmitir uma mensagem - de preferência edificante. Cada vez mais tenho gostado menos dessa ideia, como se só assim a ficção pudesse contar da vida. No filme, o patriarca da família que vive encerrada numa caverna, conta as histórias para a família como uma indicação do que não fazer. Do que é perigoso. Conta as histórias como uma lição do que fazer ou não fazer. Expulsos da caverna pela natureza, eles encontram Guy, o andarilho, que conta as histórias como uma possibilidade do que a vida pode ser, de como a sonhamos e como a vemos. Por isso só, o filme já é muito especial para mim. Nem precisava ser tão engraçado e querido como é :)

Oblivion (Joseph Kosinski. US, 2013) foi uma das grandes surpresas que tive no cinema há muito tempo. Com ele, percebi como surpreender-me com os filmes hoje está bastante difícil. A surpresa tem vindo com produções mais antigas que ainda não havia visto... mas, na sala de cinema, ela tem sido rara. Aqui ela foi bem-vinda! De muito bom gosto, com uma história genial que me lembrou 2001, Uma Odisseia no Espaço, um roteiro incrivelmente bem amarrado, saí do cinema encantada e feliz por não haver sucumbido ao preconceito de não ir a um filme com Tom Cruise - triste de reconhecer, mas é isso aí. Joseph Kosinski (eu só lembro de Bobinsky, de Coraline :) é um nome para se ficar atento, á nessa sua segunda jornada na direção, juntamente com o roteiro (adaptado da HQ) e produção. Amazing e belo.

Em Jack - O Caçador de Gigantes  (Jack The Giant Slayer. Bryan Singer, US, 2013) a experiência foi muito diferente - e aí entra também a danada da expectativa. Se de Oblivion eu esperava nada, Jack, por outro lado, era um filme que queria muito ver. E fui a duas sessões dele no mesmo dia, com amigos diferentes. Na segunda sessão, já era visível o quanto eu estava desapontada. Jack é daqueles filmes em que nada parece estar fora do lugar - tudo ali, direitinho, check. Mas não há história, é um filme sem alma. E  como eu queria gostar dele! Mas saí bastante desapontada, como tem ocorrido com muitas produções atuais - e foi o caso, já adianto, de Iron Man 3 (Homem de Ferro 3. Shane Black, US/China, 2013): grandes produções, filmes esperadíssimos, personagens incríveis e, na famosa hora H, blah blah blah, tudo se perde num roteiro superficial, mal escrito e, como já disse antes, totalmente sem alma. Uma frustração. Um roteiro bem escrito, honesto, com foco nos personagens, consegue transformar qualquer produção mais simples em um grande filme. Pena que os produtores dos blockbusters atuais estão se esquecendo disso. 

A Caça (Jagten. Thomas Vinterberg, Dinamarca, 2012) eu não direi que me surpreendeu, porque, de uns anos para cá, só tenho esperado o melhor do cinema nórdico. E, fora o último filme de Susanne Bier, não tenho me decepcionado. Um olhar cuidadoso para a vida tem sido a marca dos filmes suecos e dinamarqueses que tenho visto. A violência tem tido um destaque e penso com tem sido a vida lá para cima, porque as histórias desses filmes são quase insuportavelmente palpáveis. A injustiça, a falta de senso, a perda da percepção do outro como uma pessoa têm sido constantes nessas produções. Aqui, de tão intensa, eu chorei de raiva. De frustração. De incredulidade. E de pavor, pois aquelas pessoas, projetadas na tela, não eram em nada diferentes do que tenho visto no dia-a-dia, em situações que, mesmo diferentes no acontecimento e gravidade, tocam essa ferida da falta de comunicação e atenção que, hoje, se torna descomunal. 

O dia que durou 21 anos (Camilo Tavares, Brasil 2012 - produzido pelo jornalista Flávio Tavares, um dos prisioneiros da ditadura libertados no México) eu fui assistir como companhia a uma pessoa querida, que vivenciou de muto perto, e sofreu de muito perto também,  a instalação da ditadura no Brasil. Acho que devo ter passado todo o filme de queixo caído - não acreditava nos documentos que via projetados na tela, assim como as gravações e filmagens. Parecia ficção, surreal demais para ser verdade. Apesar de um documentário ser também uma história roteirizada e trazer em si a visão dos seus realizadores - em suma, é também uma leitura da realidade, como a ficção -, o valor documental do filme é extraordinário. Saí com um peso enorme na alma. Do meio ao final da ditadura, eu era uma criança, e pensar que vivia num mundo barbaramente cruel sem saber acabou comigo, ali, naquela sala de projeção, de forma que nunca havia acontecido antes. Assim o cinema faz: apresenta um confronto inegável com a nossa realidade. Um espelho cruel, esse cinema, mas incrivelmente genial e necessário.

O último filme até agora foi uma reprise: Pulp Fiction - Tempo de Violência (Pulp Fiction. Quentin Tarantino, US, 1994) eu revi, depois de muito tempo, no Vivo Open Air, edição de 2013. Fiquei maravilhada com a estrutura - na tela gigante, as imagens são incríveis. No sistema 12.1 de som, não se percebe uma falha. Eu tenho um encanto grande com cinema ao ar livre - e sei que não estou só. Rever um filme tão forte e especial para mim, naquela telona, foi uma festa. 

Eu ria, me surpreendia e não acreditava como Pulp Fiction ainda está ali, sem envelhecer. Falo sempre tanto dele, que quase se tornou um clichê. Por isso revê-lo foi tão importante. De senso comum, ele voltou a ser um destaque. E por falar em roteiros bem escritos e surpreendentes, esse é um dos melhores que já vi. Andamos pela narrativa não linear sem tropeçarmos. A direção de Tarantino é uma loucura de ser ver, agora na distância furor que foi a estreia do filme à época. Um casamento feliz esse: uma estrutura bela + um filme genial = festa no cinema!

Se os filmes eu encontrei pouco, imagine os livros. Eles estão constantemente comigo - não consigo dormir sem ler -, mas eu cheguei a eles com calma, lerdamente - até porque nenhum realmente me conquistou de imediato.

De Maggie Stiefvater, autora de Shriver, série de werewolves melancólica e bela, li dois livros. The Raven Boys é o primeiro de uma série - segundo capítulo será publicado no final do ano. Ele tinha tudo para me prender desde o início - que é bastante poético. Mas a história, apesar de boa, se enrola, enrola, enrola... e, claro, só foi ficar interessante nas últimas 50 páginas, que me encontraram às 2h da manhã, pertinho da hora de acordar (e não é sempre assim?). Como a continuação ainda demora, pensei em conhecer outra série da autora, agora de fadas (a anterior é de fantasmas e lendas celtas). 
Blue Sargent had forgotten how many times she’d been told that she would kill her true love.Her family traded in predictions. These predictions tended, however, to run toward the nonspecific. Things like: Something terrible will happen to you today. It might involve the number six. Or: Money is coming. Open your hand for it. Or: You have a big decision and it will not make itself.
The people who came to the little, bright blue house at 300 Fox Way didn’t mind the imprecise nature of their fortunes. It became a game, a challenge, to realize the exact moment that the predictions came true. When a van carrying six people wheeled into a client’s car two hours after his psychic reading, he could nod with a sense of accomplishment and release. When a neighbor offered to buy another client’s old lawn mower if she was looking for a bit of extra cash, she could recall the promise of money coming and sell it with the sense that the transaction had been foretold. Or when a third client heard his wife say, This is a decision that has to be made, he could remember the same words being said by Maura Sargent over a spread of tarot cards and then leap decisively to action.
But the imprecise nature of the fortunes stole some of their power. The predictions could be dismissed as coincidences, hunches. They were a chuckle in the Walmart parking lot when you ran nto an old friend as promised. A shiver when the number seventeen appeared on an electric bill. A realization that even if you had discovered the future, it really didn’t change how you lived in the present. They were truth, but they weren’t all of the truth.
“I should tell you,” Maura always advised her new clients, “that this reading will be accurate, but not specific.”
It was easier that way.
But this was not what Blue was told. Again and again, she had her fingers spread wide, her palm examined, her cards plucked from velvet-edged decks and spread across the fuzz of a family friend’s living room carpet. Thumbs were pressed to the mystical, invisible third eye that was said to lie between everyone’s eyebrows. Runes were cast and dreams interpreted, tea leaves scrutinized and séances conducted.
All the women came to the same conclusion, blunt and inexplicably specific. What they all agreed on, in many different clairvoyant languages, was this: If Blue was to kiss her true love, he would die. (pp. 7/8).

Lament: The Faerie Queen's Deception tinha tudo para ser uma história bonita e interessante. Mas os personagens se perderam em algum buraco negro da narrativa. E o final, numa tentativa de surpreender e ser diferente, se distanciou ainda mais do que parecia ser a jornada dos personagens. Estou confusa até agora, achando que li o livro de forma errada. Mas nem que vou relê-lo. Dei uma olhada no segundo capítulo da série, Ballad, e a coisa parece que vai do pior ao insustentável. Melhor, então, parar por aqui. Uma pena, Shriver é uma trilogia de que gosto muito.... e acabo por torcer pelos autores das minhas histórias :)

Antes desses dois, no entanto, veio Jane Austen Ruined My Life, de Beth Patillo. Eu adoro, mas adoro de verdade, livros que se referem a Jane Austen. Já li alguns - um deles, Austenland, está para sair no cinema. Me and Mr. Darcy, de Alexandra Potter, que comprei num posto de estrada na Inglaterra, já seria especial por isso só, mas é o meu preferido em história. A este eu cheguei, neste mês, ao procurar a referência dos anteriores para passar a uma leitora de JA. Esbarrei com o título, que não conhecia, e imediatamente o comprei pela Cultura, para ler no Kobo. 

“You don’t believe me?” “You have to admit, it all sounds a bit far-fetched.” “Most true things do,” she replied. (Cap. 4, p. 23.)

“So you don’t believe in happy endings?” I asked. 
“Is that really what you want from a relationship?” Barry asked, eyebrows arched. “An ending?” 
“It’s a figure of speech. It’s not meant to be literal.” 
“It is when women use it.” Barry crossed his arms over his chest. “Where did women get the idea that once a man commits to marriage it’s all over?” He uncrossed his arms, put them on the table, and leaned toward me. “That’s just the beginning.”
I frowned. “You don’t seem like the kind of guy to have a lot of experience with commitment.” And then I was afraid I might have offended him, but he appeared unfazed. 
“That’s where you’re wrong. I’ve been married. Twice. Never again, though. Wedding vows make women lose their minds. They think the tough part’s over.” A flush stung my cheeks, because I was certainly guilty as charged. (cap. 14, p. 21/22).

While I loved the elegant portraits by the most renowned artists of that day, my favorite portrait had little, if any, artistic merit. It was also quite small, no more than a few inches square. The subject’s sister had done a quick study in pencil and watercolor, left half finished, and no relative of the subject had ever thought it much resembled the person who posed for it. Still, it was the only authenticated portrait of Jane Austen known to exist. (cap. 15, p. 4).

That thought, that moment, standing in front of her portrait, renewed in me a desire I hadn’t experienced in years. I slipped my purse off my shoulder and dug around in it, fumbling for the notebook and pen I’d purchased that morning. I looked around, eager for a place to sit, but this particular gallery didn’t have any benches, so I slid to the floor, letting go of any sense of dignity and decorum. Them I uncapped the pen and let it fly across the page. (cp. 15. P. 8).

“You were so certain that you had to have a hero that you forgot to look for a man.”
“What?” 
“Who could measure up to your Jane Austen fantasies? No mere mortal could satisfy you.” (cap. 17, p. 15).

É fofíssimo, como os outros, embora essa tentativa insana que alguns escritores têm de defender uma tese com seus personagens me aborreça um pouco. É aquela história do começo: as histórias têm de possuir uma moral específica para nos dizer algo? No, please. Deixem a história falar por si, authors, please! Não os massacrem com suas teses.

Bom, no livro de Beth Patillo não ocorre um massacre exatamente, mas a tese está lá. E não é que ela seja enganosa, pelo contrário. Só que, assim, na forma de defesa, e não de história, ela entra num caminho que não é dela. 

Gosto muito do que John Green escreve antes de iniciar a história em The Fautl in Our Stars. Ele dedica o livro a Esther Grace, que morreu, aos 16 anos, do mesmo tipo de câncer que tem sua protagonista, Hazel Grace. A confusão que poderia - e se instalou - de que a história no livro se baseia nos famosos fatos reais o levou a deixar este esclarecimento:  
This is not so much an author’s note as an author’s reminder of what was printed in small type a few pages ago: This book is a work of fiction. I made it up. Neither novels nor their readers benefit from attempts to divine whether any facts hide inside a story. Such efforts attack the very idea that made-up stories can matter, which is sort of the foundational assumption of our species. I appreciate your cooperation in this matter.

Assim é com a tese: uma história não precisa trazê-la explicitada para que tenha, em si, lições valiosas. Made up stories matter a lot!



PS: A Caça trouxe um dos meus atores preferido atualmente, Madds Mikkelsen. Considerado um símbolo sexual na Dinamarca e Suécia, onde representa diferentes papeis, mas, geralmente, o do protagonista herói, nos Estados Unidos ele é escalado principalmente como vilão - como vimos em 007 - Casino Royale. Ele esteve recentemente aqui no Viagens com O Amante da Rainha. Eu o comecei a prestar mais atenção nele com um filme de Susanne Bier que é um dos meus preferidos for life, Depois do Casamento (Suécia/ Dinamarca/ Inglaterra/ Noruega, 2006), o qual também me chamou a atenção para a qualidade das produções desses países vizinhos. 

Continuando a tradição de ter sua fisionomia - peculiar, digamos assim - associada à caracterização de vilões, Mikkelsen faz parte do excelente elenco de Hannibal, série de TV criada por Bryan Fuller (US, 2013), o mesmo de Pushing Daisies e Heroes. O seriado traz a relação de Hannibal Lecter (Madds, e quem mais?) com o agente do FBI Will Graham, antes de ser descoberto como o famoso canibal. Eu vi apenas dois episódios por enquanto. Apesar de incrivelmente bem feita, beirando a genialidade, a série é intensa as hell, absolutamente gráfica nas mortes e, por isso, eu chego nela em encontros esporádicos.  

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