segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

E a luz se fez...

Uma das partes que mais me cativaram a emoção em A Invenção de Hugo Cabret, livro de Brian Selznick, foi quando Prometeu aparece em pintura na entrada da cinemateca francesa. Ao doar ao luz à humanidade, numa das maiores transgressões mitológicas da história do universo, ele teria, consequentemente, permitido o surgimento do cinema. 

Ao tomar conhecimento da adaptação desse livro, um presente querido da Rita, que vive e trabalha entre os livros, o receio e a suspeita foram grandes. Tudo bem, o projeto estava sob a direção de Martin Scorcese, mas para mim nem ele seria capaz de traduzir em sons em imagens o que, para mim, já era perfeito e cinematográfico em papel, tinha e letras.

Após assistir a A Invenção de Hugo Cabret (Hugo. Martin Scorsese, US, 2011) duas vezes no cinema - uma delas na tela gigantesca do Cinemark, num 3D maravilhosamente bem utilizado - eu tive de dar o meu braço a torcer mil vezes. Na primeira vez em que o vi, a emoção foi constante, e as lágrimas vieram em vários momentos.

A emoção veio pelo reconhecimento. Se o livro parece um filme, em seus planos-sequência cinematográficos, em que a imagem não ilustra, mas é narrativa tanto quanto as palavras, o filme traz o livro constantemente para si, em imagens que voam na tela, em planos-sequência no papel que se descortinam diante dos nossos olhos. 

Depois de assistir a Orgulho e Preconceito, de Joe Wright (2005), fiquei com o sentimento de que um diretor, para poder adaptar bem um livro, precisaria ser também um bom leitor. E, principalmente, deveria ter pelo livro que adapta um respeito muito grande, se não um carinho especial. Scorsese foi um excelente leitor em Hugo. Assim, o livro que adoro e que me trouxe muita inspiração não foi repicado no cinema. Pelo contrário, ele cresceu, expandiu-se e conseguiu crescer para mim.Seus personagens também cresceram, e se tornaram ainda mais fortes e queridos pelas imagens e sons do filme.

O ponto-chave para que eu me sentisse assim foi justamente a forma como o quadro de Prometeu aparece no filme... Tão lindo, uma leitura que encontrou a minha própria, a imagem não precisou das palavras do livro para se fazer incrível. 

Dos dedos de Prometeu, expande-se a luz em projeção, diante da tela do mundo, habitado pelos seus espectadores, seres humanos que, como diz Meliés, são  - somos! - sereias, sonhadores, aventureiros...

Personagens de um sonho de cinema que é a vida.



PS: Li, esses dias, como o Oscar ressaltou filmes que traziam, em si, um saudosismo grande pelo chamado primeiro cinema. O Artista e Hugo Cabret trazem o início do cinema de forma diferente, mas que os críticos têm considerado saudosista. A própria cerimônia do Oscar, realizada ontem - na qual Hugo levou 5 estatuetas -, marcou essa época do cinema em seus cenários e figurinos.


Aqui eu gostaria de contrapor um ponto de vista: não creio só que seja saudosismo o que esses filmes trazem. Em nenhum momento senti que eles diriam como esse cinema era melhor ou superior ou mais puro, por exemplo - aspectos presentes no saudosismo - que o atual. Para mim, eles utilizam-se do que o cinema tem de mais incrível - seus filmes e cineastas e o amor dos espectadores e estudiosos do cinema - para contar de si mesmo. Para dizer da sua essência mais transformadora, a criação do ser humano e a projeção dos sonhos e mitos mais caros à humanidade. Hugo Cabret, o menino órfão que procura seu lugar no mundo, encontra com sua essência com o cinema. Sua ligação com o que tem de mais precioso, sua origem, é o cinema. De uma invenção do cinema para outra, rs, eu creio que dois filmes específicos ultrapassam o mero saudosismo e alcançam o cinema em sua beleza mais flagrante.  

E, assim sendo, como esse filme não teria um post só para si? 

Oscar night... a felicidade de Amélie

Durante a transmissão do Oscar, ainda no Red Carpet, em meio a vestidos e entrevistas, resolvei emprestar a vibração desta noite que é sagrada para mim para colocar em dia os filmes do carnaval - menos um, que merecerá um post à parte... Dá para adivinhar qual??? Dica: ele está concorrendo ao Oscar de melhor filme e é meu preferido... embora muito dificilmente ganhe. Well, não se pode ter tudo na vida, right?

O carnaval foi agitado de filmes. Um sobrinho amado e que mora longe me fez uma companhia querida e divertida a vários filmes.

Os primeiros foram À Beira do Abismo e O Artista, presentes no post abaixo. Foram dois filmes muito diferentes, mas que nos deixaram muito felizes. 

O próximo, e o primeiro inédito aqui no Viagens, foi uma decepção de proporções gigantescas, rs. Nao é que esperássemos muito de Cada um Tem a Gêmea que Merece (Jack and Jill. Dennis Dugan, US, 2011), mas não sabíamos que seria tãaaaaaaaaaao ruim. Eu havia lido coisas ruins a respeito do filme. No entanto, diante do trailer, achei que poderia ser pelo menos engraçado. 

Mas foi uma experiência horrível, que só não foi catastrófica pela presença da minha sobrinha de 8 anos, que se divertiu horrores - afinal, que criança não gosta de piadas escatológicas? O ritmo do filme é inexistente, o roteiro é espantoso de fraco. Mas, ao final, rendeu boas piadas durante a semana: o que vamos assistir hoje? Cada um tem a gêmea que merece, por favor, foi tão bom!!! A piada é sem graça, mas rimos muito mais que no filme : )

O Despertar (The Awakening. Nick Murph, UK, 2011) foi a nossa opção de suspense quase terror. Um filme inteligente de fantasmas e suspense, que teve uma conclusão bastante bacana. Mas ficamos curiosos para assistir a nossa segunda opção, que perdeu apenas pelo horário, A Mulher de Preto, com Harry Potter... Dois filmes de fantasma ao mesmo tempo em cartaz, big smile!!! Para quem não sabe, eu adoro. Mas não vejo sozinha, por isso acabo perdendo muitos no cinema.

Blank space... aqui veio o filme que ganhará seu próprio post. O lindo!

The Iron Lady (A Dama de Ferro. Phyllida Lloyd, UK, 2011) foi um filme bastante irregular com um história fantástica... escolhi a história, descartei o formato confuso. Mas, como disse um amigo, foi bastante difícil não me prender na maquiagem de Meryl  Streep (make up que, by the way, foi premiada com o Oscar esta noite), que, como quase sempre, estava fantástica na atuação. Digo confuso, embora tenha respeitado a opção de contar a história de uma das maiores líderes políticas do Século XX no Ocidente pelas suas memórias, de forma não linear. Mas, mesmo com esse entendimento, o filme me incomodou em diversos momentos.

O Motoqueiro Fantasma: Espírito de Vingança (Ghost Rider: Spirit of Vengeance. Mark Neveldine, Brian Taylor, US/Emirados Árabes, 2011) foi uma escolha pela falta de opção no horário e pelo cinema em que estava, a sala especial do Cinemark, com aquela tela gigante. No primeiro Ghost Rider eu saí antes da metade do filme por ter chegado à conclusão de que o meu coração pedia um filme mais doce naquele dia. Lembro que fui assistir algo que amei... mas não lembro mais o que, rs. Assim, não tinha como eu achar o filme ruim... me diverti e ponto. Mas é ruim demais (não tanto quanto Jack and Jill, though!).

O Artista veio novamente no meio do carnaval... e foi muto bom chegar a ele again! Pude dar mais atenção aos detalhes de um filme tão cuidadoso.

Hoje houve sessão dupla. No dia do Oscar, tentei completar a lista dos melhores filmes... faltou Cavalo de Guerra, que não está mais passando aqui.

Em Moneyball (O homem que mudou o jogo. Bennett Miller, US, 2011) eu não colocava muita fé. Por isso as ideias preconcebidas sobre um filme devem ser deixadas do lado de fora da sala de projeção... Ele me emocionou muito. E surpreendeu. Um filme sobre as pessoas, como elas são realmente tratadas como um produto nos esportes... A coincidência foi que estou lendo agora um livro que coloca esse aspecto em destaque - no caso, o mundo do tênis.

Caracas! The Girl with the Dragon Tatoo acabou de ganhar edição! Happy!

Back a Moneyball... O olhar cuidadoso sobre as pessoas me emocionou de verdade. A surpresa veio pelo filme ser sobre uma pessoa que realmente fez terríveis escolhas. Geralmente, os finais são redentores... esse não é. O que aumenta a tristeza e a empatia com o personagem de Brad Pitt. E me deixou com um peso triste no coração.

Não vou contar aqui a via crucis que foi entrar no cinema... Cinemark com sistema desatualizado pelo horário de verão (que havia mudado há doze horas, vale dizer). Basta contar que os personagens malucos e ousados dos livros e filmes estão produzindo um certo efeito em mim...rs.

Por fim, ultrapassando outro pé atrás, assisti a Tão Longe, Tão Perto (Extremely Loud and Incredibly Close. Stephen Daldry, US, 2011), adaptação para o cinema da história escrita por Jonathan   Safran Zoer, um livro de que gostei demais. Oskar é um personagem genial que, a meu ver, ficou meio histério no filme. O que o fez perder muito de sua força. Eu não esperava isso em um filme de Daldry, diretor do meu amado As Horas. E Billy Eliot.  E O Leitor... são tantos filmes queridos dele que desanimei quando vi que Extremely Loud estava com críticas muito ruins. As que eu li fizeram sentido. 

É choradeira demais. Histeria demais. Tudo para adaptar um livro que é intenso justamente pela falta de histeria. As emoções que os pensamentos de Oskar transmitem nos conduzem por uma história forte e brilhantemente escrita. O filme não conseguiu chegar a isso... Eu iria dizer que há filmes impossíveis de serem adaptados ao cinema, se não houvesse assistido a Hugo Cabret esta semana. 

E lá se foi o mistériro da dica!!!


Por último, vale dizer que o Oscar continua firme e forte... sem surpresas ainda, já que as categorias mais disputadas ainda estão por vir. Num ano marcado pelo saudosismo do cinema "de antes", a cerimônia voltou um pouco ao que era há alguns anos. Billy Cristal é o apresentador pela nona vez. Os números musicais estão mais tradicionais. Os cenários remetem à era de ouro do cinema nos Estados Unidos... E assim o Oscar consome a nossa noite, com algumas homenagens bonitas, os apresentadores e ganhadores mais descontraídos... E eu, feliz, na noite mais esperada do ano!

E aí vem melhor diretor!!!

Para os nominados e ganhadores, oscar.go.com




quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

You are smart... You are kind....

... you are important!





A valorização da pessoa e do seu espaço no mundo. Raça, credo, classe social, peso na balança, padrões de beleza, critérios sociais que alienam o ser do seu lugar na humanidade. Um lugar que, se não é igual - onde está o respeito às diferenças? -, é, sim, igualitário. A humanidade como um todo, e não partes que prevalecem sobre as outras. Sentindo-me assim eu desliguei a TV ontem, depois de assistir a Histórias Cruzadas.

The Help (Histórias Cruzadas. Tate Taylor, US, 2011), filme que concorre ao Oscar este ano em várias categorias, tem três de suas atrizes indicadas. Poderia ser todas. Como seus personagens, a atuação de todas as mulheres fantásticas que figuram nesse filme, tem seu lugar garantido. Mas aqui eu me adiantei, rs. 

The Help - o título em português faz sentido, but... - apresenta uma cidade do Mississipi nos anos 50, em plena explosão dos conflitos raciais. Uma ferida de muitos, no entanto, a discriminação racial toca fundo na história dos Estados Unidos. Livros, filmes, músicas são narrativas que trazem essa ferida e diferentes olhares sobre ela. Com algumas, eu tenho um imenso pé atrás. Já outras me mostram que, se a forma não é exatamente inovadora, há, sim, maneiras diferentes de olhar para essa história tão dolorida e injusta. 


Aqui, são as mulheres que trazem as relações numa cidade dividida por duas cores e muitas realidades. Mas, em vez de trazer puramente o antagonismo, o filme entra no que disse acima e que me conquistou na história: as pessoas e sua luta desesperada por um lugar no mundo. Não trata do antagonismo racial pelo ponto de vida político - toca nele em vários momentos, uma forma de dizer que eles existiram, não são ignorados, mas não são o foco aqui -, mas no das relações humanas diárias. Daí o título The Help, os ajudantes, os empregados caseiros negros que sustentaram o modo de vida do sul dos Estados Unidos numa relação cruel, injusta, injustificável. E muito, muito triste.


Assim, as mulheres que transitam pela trama do filme não são unilaterais, vilãs ou mocinhas sem facetas, instrumentos de defesa de uma tese. Elas são pessoas, crianças mesmo (como ressaltado pela narradora no início, crianças tendo crianças), que tentam se tornar adultos num mundo que não compreendem. Que tentam se fazer prevalecer  e respeitar pela força e pelo abuso que sofreram também. Digo isso sem justificar de forma alguma a crueldade que cometem... mas o filme conseguiu se mostrar para mim por isto: as pessoas são tão palpáveis, a força de suas dúvidas é tão intensa, que o quadro se mostra mais complexo e respeitoso à história que conta. Senti-me assim principalmente na última cena, protagonizada por três mulheres e uma criança, em que todas se colocam ali, não apenas representam um papel - de vilã, de coitada, de burra, enfim. Não defendem uma tese. Elas são. E essa honestidade foi o que me deixou feliz de haver superado minha preguiça inicial - sério, mais um filme sobre os anos 50? - e chegar a The Help.


Ok, cheguei assim, assim. Contrariando as minhas crenças mais profundas, rs, assisti ao filme online, num site indicado pelo meu sobrinho. Eu raramente vejo filmes na TV ou DVD - para dar uma ideia melhor do quanto é raro, em 2010 eu vi 95 filmes no cinema e 4 em casa. Mas, ontem, eu queria realmente muito ver o filme e não consegui encontrar um horário que coubesse no meu dia. Assim, descobri, bastante tardiamente, como é bom colocar um filme na TV, me enrolar num cobertor e assistir a um filme no conforto escuro da minha sala.  Sem culpa de haver assistido um filme concorrente do Oscar na TV...rsrs.


De volta ao início, as interpretações: elas enchem os 146 minutos de projeção. Fortes, encantadoras e surpreendentes, elas são, para mim, um dos grandes destaques do filme. Octavia Spencer, Viola Davia e Emma Stone por si só já levariam o filme nas costas. Mas elas não brilham sozinhas, assim como não mostram apenas uma face. Bryce Dallas Howard traz uma Hilly intensa, uma criança que cresce sem saber que lugar conquistar no mundo, e acaba por escolher o mais acessível, para ela, caminho da dominação e crueldade. Ahna O'Reilly poderia passar despercebida, como sua personagem Elizabeth, se não fosse a cena final, em que ela se mostra mais complexa do que acreditávamos. Alison Janey eu adoro desde The West Wing, uma de minhas séries favoritas. Ela ´é uma mãe que me lembrou tantas que conheço, e traz em si as falhas e as forças dessas figuras inacreditáveis que são as mães. E, enfim, Jessica Chastain, com uma personagem maravilhosa de querida, para nos mostrar como a exclusão ocorre em diversas instâncias, e não apenas nas mais visíveis. Ela já havia chamado a minha atenção com a mãe que interpreta em The Tree of Life, e aqui mostrou sua versatilidade em uma interpretação vibrante e não caricata. Difícil.


Senões sempre ocorrem... um dos meus, aqui, é justamente quanto à superficialidade de algumas tramas, como a do namorado, que, provavelmente, possuem um destaque maior no livro. Num filme que traz a força em cada take, o superficial fica bastante evidente. 


O Sul que se apresenta nos cinemas marca principalmente a força das mulheres e de suas relações. Elas sustentariam a sociedade - e aí, claro, os homens meio que desaparecem... Em The Help não acontece outra coisa, mas ele consegue ser diferente. Talvez pela honestidade e generosidade que tem com essas mulheres, que, enquanto extremamente guerreiras e sobreviventes em um mundo absurdamente injusto, conseguem se mostrar humanas e acessíveis. Big smile for that : )




PS: O olhar sobre a vida das pessoas, apresentado na voz de Viola Davis, é cuidadoso e acurado. Diz muito do que vivemos e vemos hoje... e traz, em si, não o julgamento, mas a percepção de como as vidas se desenrolam dentro da privacidade devassada do nosso lar.

PS2: Eu ia falar do cabelo da personagem de Emma Stone... mas a frase título deste post, dita, no filme, por Aibilleen todos os dias para a criança que cria como forma de dar a ela um pouco de auto estima, diante da rejeição que sofre da mãe principalmente pela sua aparência, me calaram definitivamente!





terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Finalmente... um livro!

Num mês bastante diferente, em Janeiro li apenas dois livros. Do primeiro, How To Be a Famous Novelist, já falei. O segundo, que terminei em Fevereiro, atropelou Norwegian Wood, o livro de Haruki Murakami que está ali na cabeceira, pela metade, me olhando...rs. 


Ender's Game, o primeiro livro da série de Orson Scott Card, chegou até mim por um comentário no eonline.com. Ao ler um artigo sobre o lançamento de The Hunger Games no cinema, um dos leitores dizia como a história de Ender era mais visceral que a história de Katniss, escrita por Suzanne Collins, e de que eu gosto muito. Bom, diante disso, o jeito foi encomendar o livro na Cultura e começar a lê-lo assim que chegou...

Para contar do que foi o livro para mim, preciso dizer que eu sou um fruto bastante sem-vergonha do mito do amor romântico. Crescendo dentro das salas de cinema com uma produção cinematográfica predominantemente ocidental e, principalmente, norte americana, o amor romântico faz parte da minha alma e preenche meu coração e imaginação. 

Digo isso porque na história de Ender, o terceiro filho proibido de um casal habitante de um mundo futurista em guerra com um povo alienígena, não há romance, triângulos amorosos, amores perdidos, etc, etc. Em The Hunger Games há, desde o início até a conclusão devastadora, que marca fortemente um dos aspectos mais doloridos da guerra, a perda dos que amamos não porque eles morreram, mas porque, no caminho da violências, as ideias e crenças tomaram rumos diferentes. to 

Wellcome to the human race. Nobody control his own life, Ender. The best you can do is choose to fill the roles given you by good people, by people who love you. (p.313).

Mas penso que o visceral a que se referia o leitor dizia respeito justamente a essa ausência: Ender's Game não tem a "distração" de uma trama secundária. Digo secundária, but... para mim o amor é central em uma história. Mas isso sou eu, rs. O livro de Scortt Card, no entanto, traz de forma contundente a manipulação violenta de crianças de seis anos que são enviadas para uma escola de guerra. Denuncia o controle indiscriminado do governo em prol de seus interesses. Expõe a mentira como ferramenta eficaz de se alcançar esses objetivos.

 Desde que li The Hunger Games, não consigo olhar para uma narrativa de antecipação, que apresentam um futuro violento e pessimista, como uma reflexão forte sobre a atualidade. Sim, isso pode ser meio óbvio, mas não sei se o é realmente. Ao trazer um United States of America dividido em treze distritos, sendo que os mais pobres sustentam os mais, e poucos, prósperos, em que a fome é uma forma lucrativa de governo, foi impossível não olhar o mundo hoje, que tem a mesma organização.

...and when their loved ones died, a believer would arise beside the grave to be the Speaker for the Dead, and say what the dead one would have said, but with full candor, hiding no faults and pretending no virtues. Those who came to such services sometimes found them painful and disturbing, but there were many who decided that their life was worthwhile enough, despite their errors, that when they died a Speaker should tell the truth for them. (pp. 322/323).


Ender's Game traz essa discussão com a mentira e a indiscriminação na formação dos exércitos e na condução das guerras. E, assim, a partir de histórias que li há pouco, volto  aos romances de antecipação que li ou vi no cinema e identifico aspectos muito fortes da nossa sociedade atual. Acho que comi mosca por um tempo, rsrs. 

 Vale lembrar que o primeiro filme de The Hunger Games (de que falei aqui mais do que o livro que li) estreia em 23 de março.


No cinema, surpresas boas e férias ainda:


O encantamento de um doce encontro de almas eu vivenciei em Minhas Tardes com Margueritte (La Tête en Friche. Jean Becker, França, 2010), que já tem história em Os Degraus de Amélie

Era para ter escrito sobre o filme logo que o vi, mas deixei para depois... e o depois sempre se revela como muitos dias! Incrível a perda da noção do tempo que tenho experimentado. Mas, enfim... aqui está ele.

E como é lindo! Eu cheguei ao filme desconfiada que só, com um pé atrás muito grande em relação a Gerard Depardieu. Mas a história de Germain, o brutamontes de coração imenso que encontra seu lugar no mundo por meio da amizade com Margueritte e as histórias do livro que ela lê - Margueritte, uma senhora delicada e de coração imenso -, me conquistou devagar, de forma suave, e me deixou com lágrimas nos olhos e muito carinho no peito. 


Viagem 2: A Ilha Misteriosa (Journey 2: The Mysterious Island. Brad Peyton, Us, 2012) eu vi com as crianças. Eu me diverti demais, mesmo que o filme seja apressado e tenha a função explícita de entretenimento rápido e descompromissado. Well, e o que haveria de errado com isso? De Dwayne Jonhson eu e Marcelita gostamos desde Treinando o Papai (2007) e do hilário O Fada do Dente (2010) - mesmo que, nesse caso, ele tenha substituído Brendan Fraser, que participou do primeiro Viagem

O filme traz ainda o link com Julio Verne e com a veracidade que teriam suas histórias - viagens... - fantásticas. É uma delícia, mas um pouco mais de cuidado e tempo para construção da história não teriam feito mal a ninguém.


À Beira do Abismo (Man on a Ledge. Asger Leth, US, 2012) é férias, férias, férias. Divertidésimo, inteligente, deixa o coração na mão em algumas cenas. Traz, também, Sam Worthington, que ficou famoso com Avatar, mas que me conquistou mesmo no quarto filme do Exterminador do Futuro - A Salvação. Ri demais - da comédia e de nervoso, rs -, gritei um pouco, quase pulei da cadeira. Férias boas em 102 minutos...

E hoje, finalmente, cheguei ao cinema para assistir a O Artista (The Artist. Michel Hazanavicius, França/Bélgica, 2011), um dos mais fortes candidatos ao Oscar deste ano.

 É curioso como o meu coração é, ao mesmo tempo, completamente aberto e desconfiadíssimo no que diz repeito ao cinema. Com alguns filmes, soa um alarme em mim que, para ser honesta, raramente se justifica. Parece que, quanto mais o barulho e estardalhaço da imprensa com um filme, mais pé atrás eu fico. Algumas vezes essa precaução se justificou... mas, em outras, ela não apenas foi enganosa, como me impedia de chegar uma história que acabou por me tocar muito.

The Artist é assim. Meu amor por ele não foi tão intenso quanto em outros filmes por que me apaixonei definitivamente depois de superar a rejeição inicial. Mas, no the end, eram muitas as lágrimas nos olhos e a alegria em mim. Um encantamento feliz.


Eu suspeitava principalmente da proposta de fazer um filme nos moldes das produções de Hollywood (land!) do anos 20. O fazer como pode se tornar um tiro que sai pela culatra muito fortemente. Por outro super lado, ao fim de O Artista - um final que o tornou espetacular, mais uma prova de como os finais são importantes - me lembrou uma frase de Carol Shields, em Jane Austen - A life. A romancista, ao apresentar a biografia da autora inglesa Jane Austen, diz como a ficção pode contar dos fatos de uma forma mais abrangente e generosa que a descrição. 

The novelist George Gissing wrote that “the only good biographies are to be found in novels”. He was speaking about the genuine arc of a human life, that it can perhaps be presented more authentically in fiction than in the genre of biography (…) fiction respects the human trajectory. (p. 11).

Trata-se de uma dimensão da vida humana que a descrição e a transcrição não alcançam. Não suprem. A ficção pode tecer, então, a narrativa dessa dimensão – no que não está só. No entanto, como o mundo ficcional pode refletir e questionar o mundo real? 

How does a writer extract from real life those components that describe and interrogate “life” without pretending to be a replication? How does the writer signal to the reader that a novel’s fictional skin is something other than reportage? By now many degrees is mimetic art separated from the seen, felt, and heard field of our own being? How closely do we desire an overlapping of the real and the projected? Not at all? Or do we want to be persuaded that fictional truth is congruent with what we know, what we have already heard and accepted? (p. 142).

O Artista traz as palavras de Shields em imagens... em preto e branco e sem som ambiente - somente a música. Conta a história do início do cinema nos Estados Unidos não com uma descrição, mas com vivência, pelos personagens, do que representou o  surgimento dos grandes estúdios, o advento do estrelato, as mudanças técnicas com as novas descobertas. Passeamos pelo início do cinema em imagens e personagens repletos de referências ao cinema que já conhecemos. 

 Já vimos algumas dessas imagens em outros filmes, e talvez seja isso que torne O Artista um filme tão querido. Ele traz esse encantamento que vivemos, nos faz vivenciá-lo novamente, e propõe que, para isso, possamos imergir na forma, e não somente nas histórias, que o cinema possuía nessa época. Eu mergulhei nessa viagem, dela saí feliz e emocionada. E, de bônus, superei mais um preconceito : )



 Ao procurar Brendan Fraser no imdb.com, lembrei de um filme dele de que gostava bastante e que vi por acaso na TV a cabo há muitos anos: Still Breathing (James F. Robbinson, US, 1997). O nome em português, que descobri agora, ao procurar no google, é A Garota dos Meus Sonhos. O título original é mais exato - embora a garota realmente estivesse nos sonhos dele -, e vai bastante contra o poster sorridente, colorido e alegre. O filme é mais denso do que parece e seus personagens não são nada sunshine. Ele me tocou muito, embora eu o tenha visto há muito tempo. Foi bom reencontrá-lo no imdb e, agora, com o nome, posso tentar vê-lo novamente - com todo o estranhamento que alguns filmes dos anos 90 causam hoje... A última cena, já nos créditos finais, é fofa... e ela ficou na minha lembrança.  Eu a trago aqui - ok, conto o final, mas não a história, rsrs.  Novamente um the end que transforma todo o filme. 

There are two things I always wanted to believe in, but didn't dare. One, is that there is one man, somewhere, who is made just for me. The other is that I just might... deserve him.