domingo, 4 de março de 2012

Heartbreaking Love e o Mito do Amor Romântico

Suspiro, suspiro, suspiro...

Como eu amo certas histórias.



The Clockwork Prince, segundo livro da série The Infernal Devices e o último que li no mês passado, chegou no final de fevereiro para mim. Depois da decepção com Cassandra Clare e sua, a meu ver, gananciosa e indevida continuação de The Mortal Instruments, uma trilogia que ela resolveu transformar em saga de seis volumes, meu coração ficou feliz de estar novamente no mundo dos Shadowhunters. 

Antes de estender a história de Jace e Clary, que se passa nos dias atuais, Clare havia nos levado novamente ao mundo dos nephilins, demônios e downwolders (bruxos, vampiros, fadas, lobisomens) com The Infernal Devices. O mesmo mundo, mas ambientado numa Londres vitoriana. Com uma construção muito parecida de personagens (Will, descendente de Jace, é quase uma defesa de como o sarcasmo pode ser transmitido geneticamente, rs), a série me surpreendeu neste segundo livro com a criação de uma dinâmica diferente entre eles, mesmo que mantendo o drama em high level.

E aí eu pensei numa coisa, que já esteve presente no post anterior. Há fatores em uma narrativa que nos pegam literalmente pelo pé. Um personagem extremamente sofrido, que traz em seu interior uma história bastante dolorida, camuflada num exterior cínico é realmente um clássico. Nos filmes, nas séries de TV, nos livros amados, esses heróis sofridos - como todo herói, claro -, que sobrevivem no mundo em sua armadura cínica de proteção, nos cativam certeiramente. Eu lembro de uma cena de Sookie com Eric, no seriado True Blood, em que ela, em sonho, o abraça e diz, com seu sotaque sulista, que consegue enxergar como ele realmente é para além do seu exterior super malvado, rs. 


The human heart has hidden treasures,
In secret kept, in silence sealed;
The thoughts, the hopes the dreams, the pleasures,
Whose charms were broken if revealed.
Charlote Brönte, "Evening Solace" (p. 123).


Essa capacidade de ver marcaria também a diferença da heroína para os outros personagens. Ela consegue alcançar, no herói sofrido, o que poucos ou ninguém mais consegue. A amizade verdadeira também alcança esse olhar transcendental. E assim, ao emergir na alma da pessoa, ao sair da superfície, as relações fortes se construiriam. 

Nessa construção, aparecem, claro, os triângulos amorosos. Três pessoas que se identificam e reconhecem e criam laços de amizade e amor romântico por essa identificação. Outra vez vem a palavra: clássico.


That is not the way to get them, Will," she said softly. "You cannot buy or drug or dream your way out of pain." (p.196).

Jace, Clary, Alex... Jace, Clary, Simon... os triângulos de The Mortal Instruments, que se diluíram de forma imperdoável com a continuação da série (Cassandra Clare, what were you thinking???), se intensificaram, de outro lado, com Will (ahhhhhhhhhhh), Tessa e Jem em Clockwork Prince. Mais heartbreaking than ever, essa história me segurou nos últimos dias a  ponto de eu sair de um compromisso no meio para poder terminar o livro... Como eu amo isso : )


Will: "Unrequired love is a ridiculous state, and it makes those in it behave ridiculously." 
(p. 367, Clockwork Prince).

Jace: "I was laughing at you because declarations of love amuse me, especially when unrequired."
 (p. 41, City of Bones). 






Ontem à noite, após o fim do livro e do meu compromisso, assistindo ao 14º episódio da terceira temporada de Fringe, me foi confirmado mais uma vez algo que percebo muito nas narrativas de ficção: como uma história de amor impossível amarra bem um conto e como ela é um fator de sucesso de muitos livros, filmes, músicas...

Robert A. Johnson, escritor e psicólogo junguiano, já dizia, em seu livro We, da perversidade que foi a constituição do mito do amor romântico para o Ocidente. Chinelinho velho para o pezinho doente, a sociedade ocidental e o mito do amor romântico se encontraram em um casamento duradouro e perverso para a constituição emocional do homem ocidental. O amor verdadeiro, trágico na sua impossibilidade de concretização, encontra-se presente na nossa busca pelo amor, invadindo nossos relacionamentos e as escolhas de quem amar. Para contar desse casamento infame, que se perpetua por gerações e gerações, Johnson traz a história de Tristão e Isolda em We, um livro simples que se refere a algo bastante complexo e complicado.

Come to me in my dreams, and then
By day I shall be well again.
For then the night will more then pay
The hopeless longing of the day.
Matthew Arnold, "Longing" (P. 392).

Outro mito importante é o da Jornada do Herói, sobre o qual Joseph Campbel discorreu de forma detalhada e bela em seu ciclo de entrevistas para Bill Moyers - publicadas em vídeo e livro -, O Poder do Mito. O herói, em sua jornada pelo autoconhecimento e realização do feito heroico, passa por várias fases. Uma delas é a realização de sua real natureza, de que ele era inconsciente antes de sua jornada. 

E aqui os dois mitos se encontram em muitas histórias e personagens queridos.

O amor romântico é uma das muitas formas de o herói se conscientizar da sua essência. No Ocidente, é uma das formas favoritas e mais presentes nas narrativas. O amor intensifica a construção do herói e o apresenta em cores mais humanas e, claro, atraentes.


He has believed one thing for five years, and now he has realized that all this time he has looking at the world through a faulty mechanism - that all the things  he sacrificed in the name of what he thought was good and noble have been a waste, and that he has only hurt what he loved."
"Good God," said Woosley. "Are you quite sure you've helped him?"
"Quite sure," said Magnus. "It is always better to live the truth than to live a lie." (p. 413).


People, meet Jace : )
Eu, na função de cria declarada do amor romântico - afinal, eu me criei com essas narrativas -, não resisto a uma história de amor impossível e a um herói perturbado. Sofro terrivelmente, me apego, e acabo por refletir em vários aspectos da minha própria vida enquanto acompanho essa jornada de percepção da própria vida construção da consciência.

E o Universo, que deveria ajudar a me livrar dessa fixação, colabora com ela cada vez mais, rs. O espertinho põe em meu caminho, toda vez que me questiono sobre a intensidade com que vivo essas histórias, elementos que a intensificam mais ainda. Tudo bem, garoto. Acho o máximo. Que dias legais foram esses : )

Will e sua luta por afastar todos os que o amam - a explicação vem nesse segundo livro da série, e é realmente de cortar o coração - apareceram para mim nesta semana na forma de uma música de que gosto muito, mas que não ouvia há tempos. Claro, eu tinha de gravar um CD do The Verve e chegar a ela justamente quando Will, Tessa e Jem me torturavam terrivelmente com seu conto de amor, lealdade e demônios à solta. 





History

I wander lonely streets
Behind where the old Thames does flow
And in every face I meet
Reminds me of what I have run from
In every man, in every hand
In every kiss, you understand
That living is for other men
I hope you too will understand

I've got to tell you my tale
Of how I loved and how I failed
I hope you understand
These feelings should not be in the man

In every child, in every eye
In every sky, above my head
I hope that I know
So come with me in bed
Because it's you and me, we're history
There ain't nothing left to say
When I will get you alone

Maybe we could find a room
Where we could see what we should do
Maybe you know it's true
Living with me is like keeping a fool

And one and one is two
But three is company
When you're thinking about the things you do
And you're thinking about the things you do
I want to tell you my tale
How I failed in love and jumped out on my bail
Do you understand there's more in a smile than in a hand
In every sky, in every kiss
There's one thing that you might have missed

Why am I going to
A place that now belongs to you
But you are me and so am I
Let's pick it up, let's even try
To live today, so why not smile
Don't dream away your life coz it is mine
Is that a crime (repeat) this life is mine
But the bed ain't made but it's spilled full of hope
I've got a skin full of dope (repeat)






PS 1: Esta semana também trouxe a divulgação da capa do quarto livro de The Mortal Instruments, City of Fallen Angels. Ugh total. As capas dos três primeiros foram tão bonitas. As novas, a partir do quarto livro - bad, bad idea -, começaram a mostrar o rosto completo dos personagens, em capas mais cafonas e menos impactantes - rostos em capas são sempre uma ideia muito ruim. Mas, nesse caso, eles acompanham a ideia ruim mor, qual seja, a continuação de uma série que havia deixado, apesar da saudade dos personagens, um sorriso contente em mim. O que a ganância não faz...


PS2: Vale lembrar que os três primeiros livros de TMI já estão publicados em português: Cidade dos Ossos, Cidade das Cinzas, Cidade de Vidro.

PS3: A adaptação de Cidade dos Ossos para o cinema estava prevista para sair este ano. No entanto, o projeto, que já tinha uma página no imdb.com e diretor, Clary e Jace escalados, está em suspenso e as informações anteriores não constam mais do site. Acho bom o povo pensar muito bem mesmo, porque escalar Jace não será fácil, rs. 

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